terça-feira, dezembro 14

Em tom de agradecimento.

A voar perdido. Vagalume, a vagar. Vago. Preenchido por um vazio que nada adiciona, que nada induz, que nada muda, por mais que mude os dias, os tempos. Mas houve um acontecimento que fez, por alguns instantes, mudar. Fez a ferida aberta, por momentos, parecer cicatriz, parecer apenas lembrança ou algo que não está mais lá. Fez só ser vista, não sentida. Um acontecimento incomparável, inimaginável. Inimaginavelmente real e concreto.
As lágrimas secaram. Congelaram em três únicas gotas pretas, desenhadas na face. A brisa do vento, lá de cima, da pedra mais alta, eu senti enquanto ouvia o som doce e choroso da flauta. Enquanto ouvia o violino, o violão e a voz de um poeta que se faz de palhaço, que se faz de famoso. Reverenciado por milhares de outros palhaços semelhantes. Gente rara, que só encontrou naquele momento uma desculpa esfarrapada para se reunir e celebrar. Se lembrar se celebrar mais e mais.
Há muito não me sentia tão acolhido, tão ouvido, tão importante. Sentindo-me um tanto bem maior. Envolto em um abraço mais do que coletivo: Humano. Um abraço em que se torna tudo uma coisa só. Multiplicam as alegrias, dividem as tristezas, somam os sorrisos e subtraem o peso na consciência. Abraço de camaradas, sejam d'água ou da breja. Que só de ver o sofrimento do irmão de nariz vermelho, viram abaçaiados e gritam para que o pajé palhaço ouça: "Toca vagalumes!"
Mais do que minha música. Uma canção feita especialmente e específicamente para mim. Para o vagalume que se transofma uma criança quando enxerga em sua frente a caixa de pandora, onde encontra-se àquela sua estrela favorita. Estrela cadente, brilhante. Pois só com o hino esta caixa pode ser destrancada e todo seu conteúdo observado. O coro foi alto o suficiente para que ele pudesse ouvir e refletir, começando assim a dedilhar os primeiros acordes.
Foi mais do que bom, mais do que perfeito. Foi completo. Ou quase, é verdade. Ainda me faltava algo, mas o êxtase era tão grande que a ferida aberta parecia cicatriz e as dores pareciam lembranças. Ainda que primitiva, era uma felicidade. Ver a caixa aberta da felicidade, mesmo sem sentí-la, já me era um alento. Um fardo a menos a carregar, mesmo que no dia seguinte eu já soubesse que tudo voltaria a ser como fora nos últimos meses.
Como se quisesse-a inteira e minha metade de volta. Como se tivesse me perdido em uma excursão à lua e tivesse pertido uma parte que não tinha.
Soul brasileiro, me mato pra não morrer. Encaro meus monstros com mérito de abaçaiado. Num passado remoto eu perdi meu controle, sim. Acusei, abandonei e fiz sofrer. Mas também sofri os mesmos crimes. Há suspeitos? Há culpados? Há vítimas?
Nos timbres, nuancias e tons que se espalharam pelos pelos, pela boca e cabelos, outros palhaços - que não são por natureza - roubaram a cena por instantes. Exagerados, mas que salpicaram a chamada "uma coisa só" com mais vida e originalidade. Como se pudessemos correr até a varanda pra ver o céu em degradé, trazendo a noite, descanso do sol que gira, que girassol. Como se pudessemos ser todos garotos, que são fracos aos mistérios do anjo mais velho.
Não há palavras, não há denominações. Foi mais que bom, mais que perteito. Foi.
Incomparável, incompreensível, impressionante, inimaginável. Inimaginavelmente real.




Muitíssimo obrigado. (Y)

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